quarta-feira, 16 de agosto de 2017

ESCOLHAS


À partida, tanto quanto posso recuar no tempo, a questão política está antes de começar a escrever. Ainda no liceu, quando fazíamos escolhas para jogar futebol, já fazíamos escolhas políticas. Eu lembro-me que só tive três colegas negros em cento e tal alunos. Mesmo assim quando fazíamos as escolhas para jogar pequenos jogos de futebol, ficávamos juntos, de um modo geral, por exemplo, Gentil Viana, Iko Carreira, na mesma equipa e os outros ficavam noutra equipa. Era uma escolha. Não percebo como, porque é aquela escolha em que se põe um pé à frente do outro, até que quem pisa escolhe primeiro… No fim dávamos conta que eram quase sempre os mesmos na «nossa» equipa. Numa dada altura, com 15/16 anos, houve um clivagem entre os que, na Mocidade portuguesa, escolheram ir para a milícia, para a parte mais militarizada, e os que escolheram ir para os desportos náuticos. E aí nós dividimo-nos. Depois fui-me dando conta da realidade com a leitura dos russos: Gorki, Turguêniev, Techkhov, Dostoievski… só depois Tolstoi… o melhor veio pela literatura.

José Luandino Vieira em Os Papéis da Prisão

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